O Divórcio e a Família
- Dinâmicas Relacionais Pós-Divórcio -
É na relação humana onde os sentimentos mais contraditórios podem surgir. Quantas vezes assistimos, em caso do divórcio, a um casal de costas voltadas? Estão muitas vezes presentes sentimentos como a zanga, a raiva, a frustração e a tristeza. Em que cada um dos membros pretende assumir uma posição de liderança perante o outro, onde se esquecem da noção de igualdade de poder. Como se de crianças pequenas se tratassem e o mais importante naquele momento fosse decidir “quem ganha”. Mas tudo se complica quando existem filhos pelo meio, quando o casal conjugal também assume a função de casal parental.
Sabemos que manter uma relação como pais entre duas pessoas que decidiram acabar a relação enquanto companheiros, pode ser um desafio. Algumas pessoas conseguem fazer o luto do casal e renegociar e reajustar o exercício da parentalidade com o outro membro. Porém, em muitas famílias, o fim da relação de casal não significa necessariamente o fim do conflito e das divergências, arrastando para os filhos as questões que deveriam ter ficado limitadas à relação de intimidade entre os adultos.
É inevitável que o divórcio traga repercussões para todos os envolvidos, em particular para as crianças/adolescentes, onde poderão surgir tanto questões ao nível do ajustamento emocional individual, como também ao nível relacional, onde os padrões de vinculação com a figura parental com quem as crianças ficam menos tempo irão sofrer alterações.
Menos adaptativo ainda é quando existem triangulações, em que os filhos sentem a necessidade de ser leais a um dos progenitores, afastando o outro. Nesta situação, pais resolvidos apercebem-se da situação e cortam o triângulo existente. Pais magoados aproveitam-se da situação e utilizam os filhos como arma, colocando-os no meio do conflito entre dois adultos, sem se aperceberem do impacto que isso terá nos próprios filhos.
Os Padrões Disfuncionais e a Violência Interparental
De acordo com a minha experiência enquanto psicóloga em contexto institucional com famílias com inúmeros desafios familiares, confirmando-se com a literatura existente, os efeitos da violência interparental não afetam apenas as crianças/jovens, mas também os próprios pais, que vão sentindo reduzidas as suas competências e condições para um bom exercício da parentalidade, mostrando-se incapazes ou diminuídos na resposta às necessidades fundamentais dos seus filhos. Quem não fica exausto no meio do conflito?
Se for este o seu caso ou de alguém conhecido, não hesite em pedir ajuda. A vida não acaba com a separação e aqui, poderemos ajudá-lo/a a encontrar as suas próprias forças, a traçar um novo caminho onde possa voltar a encontra-se consigo mesmo. Faça da sua situação um exemplo para os seus filhos, um exemplo de resiliência, força e coragem.
É com frequência que assistimos a que a forma de comunicação em situações de elevado conflito se foque em objetivos pessoais dos adultos, desfasados do exercício da parentalidade. É aqui que surge a importância da intervenção, no sentido de minimizar o litígio entre os progenitores, uma vez que a qualidade da interação entre os pais após a dissolução conjugal é um forte preditor da saúde mental das crianças, que vivem neste tipo de estrutura familiar.
De facto, no que diz respeito às crianças, as consequências são diversas e podem emergir de forma diferente consoante as etapas de desenvolvimento onde a criança/jovem se encontre:
- Nos bebés pode manifestar-se uma falha ao nível do crescimento físico, atrasos no desenvolvimento motor, cognitivo e psicoafetivo, alterações dos padrões de alimentação e sono;
- Em crianças em idade pré-escolar destacam-se os comportamentos agressivos (e.g., com adultos e /ou pares, crueldade com os animais, destruição de objetos), ansiedade, dificuldades de separação;
- Em crianças entre os cinco e os doze anos pode começar a evidenciar-se o bullying, sintomatologia ansiosa e/ou depressiva, comportamentos de oposição, baixo rendimento escolar, falta de respeito por pessoas do sexo feminino, desenvolvimento de crenças inadequadas sobre papéis de género, normalização da violência e consolidação de papéis de género estereotipados;
- Os adolescentes e jovens adultos podem manifestar padrões de relacionamento violento na intimidade (tanto como agressores ou como vítimas), bullying, baixa autoestima, suicídio, queixas somáticas, crenças e papéis de género estereotipados, fraco rendimento ou mesmo absentismo escolar, consumos de alcóoll e /ou estupefacientes e fugas de casa.
Reforço que, tanto no caso dos pais como no caso dos filhos, não tenham vergonha de pedir ajuda. A existência de um espaço seguro para uma criança ou adolescente a viver uma situação familiar tão impactante como um divórcio, que lhe permita expressar os seus medos e fantasias, podendo contactá-los e trabalhá-los na presença apoiante da terapeuta, fará toda a diferença.
A experiência de um apoio seguro e aceitante permitirá desenvolver nas crianças/jovens uma forma diferente de relação com outros adultos, criar a possibilidade de maior confiança nos seus pares, bem como em si próprio, permitindo construir uma nova realidade.
Quando o período pós-divórcio não é caracterizado pelo conflito, ou quando os adultos são capazes de colocar de lado as suas divergências enquanto casal e unirem-se enquanto pais, tanto os pais como os filhos se conseguem reorganizar e reajustar às suas novas condições de vida. Quando esta situação não se verifica, saber pedir ajuda, torna-se essencial.
Não hesite em pedir ajuda! Torna-se mais fácil quando o caminho é feito com apoio, respeito e dedicação. Marque a sua consulta.
Dra. Sara Loios
Psicóloga Clínica
Membro Efetivo da Ordem dos Psicólogos Nº20837